sábado, 29 de dezembro de 2007

RUNWAY INCURSION

A EUROPA DISSEMINA AS MELHORES PRÁTICAS DE PREVENÇÃO
Desde de novembro de 2004 a ICAO – International Civil Aviation Organization – passou a definir Runway Incursion (Incursão de Pista), para efeito de coleta e análise de dados, como: “Qualquer ocorrência em um aeródromo envolvendo a presença incorreta de uma aeronave, de um veículo ou de uma pessoa na área de proteção da superfície reservada aos pousos e decolagens de aeronaves”.

Com base nos dados de incidentes e acidentes colhidos nos últimos anos e buscando enfocar os fatores causais das Runway Incursions ocorridas no continente, os Estados Europeus estão reimplementando um plano de ação totalmente dirigido para a disseminação dos conceitos de Aviation Safety (Segurança de Vôo) com o objetivo de propagar as melhores práticas de prevenção contra esta ameaça às operações aéreas, enquanto se estuda com mais profundidade como as novas tecnologias podem auxiliar nesta tarefa e como minimizar ainda mais a influência do erro humano nessas indesejáveis ocorrências.

A questão da Runway Incursion sempre foi identificada como uma das mais sérias ameaças à Segurança Operacional na Aviação Civil. E, por isto mesmo, ela é uma preocupação constante dos especialistas, notadamente quando as operações aéreas acontecem em aeroportos congestionados, com pistas de táxi que cruzam as de pouso e decolagem, e que, além disto, ainda apresentem deficiências em termos de controle de tráfego aéreo.

Numa iniciativa para melhorar o nível de Segurança Operacional na Aviação Civil, a Comunidade Européia de Safety fez o Eurocontrol reeditar, revisado, em maio de 2006, o European Action Plan for the Prevention of Runway Incursion – Plano de Ação Europeu para a Prevenção da Runway Incursion, o qual é repleto de recomendações voltadas para a redução de incidentes e acidentes em pistas de pouso e decolagem. Distribuído desde 2003, como resultado de um esforço combinado de organizações representativas de todas as áreas operacionais dos aeroportos, o plano é atualizado periodicamente para se manter efetivo e eficaz.

Como o próprio plano aponta, uma política de segurança para as pistas de pouso e decolagem é um componente vital para a Segurança Operacional nos aeroportos. Além do mais, este tipo de política requer um esforço preventivo contínuo para se acompanhar o crescimento da aviação e evitar que ele aumente o número de ocorrências de Runway Incursion.

Como mostraram os Bancos de Dados europeus de Safety, analisados pelo Eurocontrol, as circunstâncias que rondam uma Runway Incursion diferem consideravelmente. Entretanto, elas surgem freqüentemente em função de uma complexa mistura de fatores contribuintes. Entre os fatores mais presentes estão os relacionados com a deficiência na comunicação entre pilotos e condutores de veículos que circulam nos aeródromos com os controladores de tráfego aéreo.

Em outros tempos, quando não eram freqüentes as pesquisas e análises dos Bancos de Dados, acreditava-se que Runway Incursions eram provocadas pela simples queda ou perda do alerta situacional dos profissionais envolvidos. Contudo, as pesquisas mostraram que a redução na qualidade e na precisão da comunicação entre o controle de tráfego aéreo e os outros atores do cenário operacional de um aeroporto é que determina este tipo de incidente ou acidente, levando-se em conta que em mais de 50% dos casos há uma autorização de tráfego válida para que os comandantes de aeronaves e/ou condutores de veículos automotores transitem por áreas próximas ou cruzem as pistas de pouso e decolagem que estão em uso.

Fraseologia fora dos padrões ICAO, mensagens prolixas e complexas, transmissões ambíguas e falhas em prover readbacks (confirmações de entendimento) são situações comumente percebidas nos reportes de incidentes e acidentes, mostrando que isto tudo leva à emissão de comunicações confusas que acabam possibilitando uma Runway Incursion.

Por isto mesmo, o aperfeiçoamento da comunicação operacional no âmbito do aeródromo deve ser uma prioridade, apesar de ser uma questão de difícil implementação pela múltipla subordinação institucional dos atores envolvidos. No Brasil, por exemplo, os pilotos são funcionários das empresas aéreas, os controladores de tráfego aéreo do DECEA – Departamento de Controle do Espaço Aéreo – e os condutores de veículos na superfície dos aeroportos ou são da INFRAERO ou das próprias empresas aéreas. Muitas vezes, o que é prioridade para uma instituição não o é para outra, dificultando uma ação conjunta.

E, além do mais, não é tão simples como se pensa a introdução de regras e instruções de comunicação para o cumprimento de pessoas, com formações profissionais distintas, e a obtenção imediata de eficiência e eficácia como resultado. Somado à esta questão, as operações em aeródromos são conduzidas num ambiente dinâmico e volátil, o que por vezes também dificulta as melhores práticas de Safety. Há momentos de extrema carga de trabalho, com múltiplas transmissões cruzadas, incompletas ou ininteligíveis, sob condições meteorológicas adversas e com os controladores de tráfego aéreo tendo que, além de fiscalizar todo tipo de manobra na área operacional, planejar as próximas quatro ou cinco ações num curtíssimo espaço de tempo.

Bem, o Plano de Ação Europeu para a Prevenção da Runway Incursion, foco deste artigo, foi desenvolvido por um dinâmico Grupo de Trabalho Europeu, criado em 2002 e ativo até hoje, formado por especialistas em Segurança Operacional e que se faz representar nos principais fóruns de discussão sobre operações em aeródromos. Agindo como uma equipe, estes especialistas trabalham com a premissa de que nenhum grupo de profissionais seja ele de pilotos, de controladores de tráfego aéreo ou de administradores de aeroportos, resolverá isoladamente o complexo problema da Runway Incursion. Até porque eles são profissionais experientes, oriundos da área operacional dos aeroportos, e conhecem bem o dia-a-dia dos problemas vividos pela atividade aérea enquanto operando no cenário aeroportuário, o que não os permite alimentar ilusões ou crenças infundadas com respeito à soluções isoladas para o fim desta ameaça.

O grupo também fez questão de adotar os princípios da Cultura Justa no seu trabalho de equipe, a mesma que não busca por culpados durante as suas análises, pesquisas e investigações. Ao invés disto, o Grupo de Trabalho concentra-se em perseguir os fatores que contribuem para o fechamento da cadeia de eventos que leva ao incidente ou ao acidente. Até mesmo porque, eles bem sabem que se profissionais de alta performance e proficiência cometem qualquer ação equivocada que possibilite uma Runway Incursion, há alguma falha no sistema que permitiu o erro humano e é ela que deve ser identificada e eliminada.

Apoiado pela IFATCA (International Federation of Air Traffic Controllers Association), IATA (International Air Transport Association), ECA (European Cockpit Association), IAOPA (International Council of Aircraft Owner and Pilot Association), IFALPA (International Federation of Air Lines Pilots Association), AEA (Association of European Airlines), ACI (Airports Council International) e ERA (European Regions Airline Association), o Plano de Ação contra Runway Incursion contem mais de 50 recomendações que reconhecem as diferenças entre os vários aeroportos, que vão de pequenos regionais a grandes Hubs (aeroportos distribuidores de vôo) com múltiplas pistas de pousos e decolagens. A página na Internet do Eurocontrol, aberta ao conhecimento público, (www.eurocontrol.int/runwaysafety/public/standard_page/EuropeanAction.html) pode dar uma noção interessante desta diversidade de aeroportos além de possibilitar o acesso ao Plano de Ação.

Sustentam o plano 56 recomendações as quais são endereçadas aos operadores de aeródromos, aos provedores de serviços de navegação aérea, às empresas aéreas e a outros operadores de aeronaves, além dos órgãos reguladores, dentre outros.

Os princípios fundamentais baseam-se na crença de que:

· As normas providas pela ICAO são adequadas para todas as tarefas associadas às ações preventivas de Runway Incursion;
· A aviação é uma indústria global e na prática há problemas que irão acompanhar as variações regionais;
· O preparo das tripulações demanda treinamento consistente e previsibilidade no que se refere à aplicação das normas e conceitos propugnados pela ICAO e do que se espera deles;
· No nível aeroportuário, o aumento do grau de Segurança Operacional somente pode se tornar uma realidade se for implementado pelo pessoal da localidade e se forem consideradas e respeitadas as diferenças locais, já que a infraestrutura e a densidade do tráfego aéreo diferem de região para região e devem ser levadas em conta no combate dos problemas associados à Runway Incursion;

No processo de implementação do Plano de Ação, algumas boas práticas têm sido identificadas e foram incorporadas a ele ao longo do tempo. Como exemplo, o que se aprendeu com a experiência prática levou o Grupo de Trabalho Europeu a considerar importante a confirmação da alta direção das empresas aéreas, por escrito, da efetiva implementação das recomendações feitas a elas pelo plano preventivo. Outra questão considerada fundamental é a manutenção de um relacionamento estrito e cordial das administrações aeroportuárias com os Runway Safety Teams (Equipes de Segurança Operacional em Pistas de Pouso e Decolagem), tal qual aqueles grupos de pilotos formados pela IFALPA para serem Aerodrome Liaison Representatives (Representantes de ligação dos pilotos com a administração dos aeroportos), os quais buscam soluções integradas e factíveis.

Além disto, alguns provedores de serviços de navegação aérea têm feito grandes esforços para melhorar o padrão da comunicação entre controladores de tráfego aéreo, pilotos e condutores de veículos das áreas operacionais dos aeroportos. Isto inclui análises regulares das gravações radiotelefônicas para assegurar que todos os atores operacionais do cenário aeroportuário estão utilizando a fraseologia e os procedimentos de comunicação corretos. Concomitantemente, os administradores dos aeroportos estão proporcionando um melhor treinamento compreensivo e sistemático de radiotelefonia aos condutores de veículos das áreas operacionais.

As inspeções e auditorias operacionais de segurança também têm subsidiado as novas ações preventivas, pois os seus relatórios têm se mostrado mais detalhados e voltados também para as questões da prevenção da Runway Incursion. A implementação dos Safety Management Systems – Sistemas de Gerenciamento da Segurança Operacional – também vêm auxiliando este trabalho de uma forma mais organizada, disciplinada e eficaz, pois um dos seus focos mais destacados é o aprimoramento e o cuidado na implantação e no uso correto das ferramentas de prevenção de incidentes e acidentes aeronáuticos.

E, por último, os especialistas continuam estudando como a tecnologia pode ajudar nesse trabalho de prevenção, notadamente no aprimoramento dos alarmes e luzes de aviso para alertar pilotos e controladores de tráfego aéreo quanto às ameaças provocadas por ações operacionais inadequadas que estejam em curso próximo às pistas de pouso e decolagem ativas. Entretanto, ainda há vários obstáculos técnicos a serem suplantados para que o uso de novas tecnologias na prevenção de Runway Incursion possa se tornar uma realidade prática.

Enfim, para se obter sucesso na prevenção de Runway Incursions deve-se estar cuidando, diuturnamente, tanto do papel a ser desempenhado pelo homem como o desempenhado pela tecnologia mais moderna no ambiente aeroportuário a fim de que a necessária vigília preventiva não sofra solução de continuidade e permita a presença de qualquer tipo de falha humana ou material, quando menos se espera.

É importante lembrar que o trabalho prevenção de Runway Incursions na Europa é fruto de uma parceria entre empresas aéreas, associação de pilotos, associação de trabalhadores e organismos de Controle de Tráfego Aéreo e Operadores de aeroportos, o que proporciona mais eficácia ao trabalho implementado.

É um bom exemplo a ser seguido, pois somente um esforço conjunto pode levar ao aumento dos níveis globais de Segurança Operacional nos aeroportos.

Um comentário:

Anônimo disse...

Caro comandante -

Represento o governo municipal de Laguna, SC. Temos interesse em oferecer nosso aeroporto municipal (1.500 x 30 m, em saibro), já homologado, para um operador profissional. Uma concessão de 35 anos, renovável por mais 35. O Sr. poderia gentilmente informar se há uma associação de operadores e como encontrá-la?

Muito agradecido,
Ricardo Valls
(48) 9997-3727