segunda-feira, 28 de abril de 2008

ATM – Air Traffic Management

O sistema “pede” uma revisão no conceito de soberania do espaço aéreo
por Célio Eugênio de Abreu Júnior

Há muito que se comemorar na indústria de aviação. Desde a realização do sonho de voar, há 100 anos atrás, e do advento da aeronave a jato, há 50 anos, este setor vem sendo responsável por 32 milhões de empregos e movimenta 3,5 trilhões de dólares americanos na atividade econômica mundial. Os seus registros de Segurança Operacional causam inveja à maioria das atividades críticas em Safety Management ao redor do mundo. As projeções de crescimento do número de passageiros a transportar são promissoras, saindo dos atuais 02 bilhões para 2.5 bilhões/ano em 2010, com expectativa de se atingir 4.5 bilhões/ano em 2025.

Sem medo de errar, podemos afirmar que a aviação sustenta a economia global nos dias de hoje. Contudo, os congestionamentos, os atrasos e as questões ambientais ameaçam se tornar o calcanhar de Aquilles da atividade, a menos que se faça algo diferente.

O foco da indústria – empresas aéreas, aeroportos e provedores de serviços de navegação – tem que ser o de aumentar a eficiência e o de implementar a performance operacional. Todavia, isto não será suficiente. Nem o investimento em infra-estrutura trará tranqüilidade ao setor, tendo em vista o explosivo crescimento previsto para ele.

Assim sendo, o ATM – Air Traffic Management – para tratar da Segurança Operacional e dos congestionamentos nos céus, vai requerer mudanças de paradigmas na forma de se prover os serviços de navegação aérea, para permitir uma maior eficiência no uso do espaço aéreo.

O Sistema ATM do futuro necessitará ser baseado em satélites e centrado nas aeronaves, de forma a voarem bem mais próximas uma das outras e em rotas mais curtas e diretas, mantendo-se um ambiente operacional harmonioso e seguro. Neste novo ambiente de vôo, intensivo em informação, o controle de tráfego aéreo tornar-se-á menos intervencionista na hora de ordenar e coordenar as aeronaves, permitindo, o máximo possível, a liberdade, a eficiência e a efetividade na operação e na organização do espaço aéreo.

Então, o que pode travar este progresso? Surpreendentemente, muito do que se necessita fazer já foi feito e aceito pela ICAO – International Civil Aviation Organization. Os problemas, agora, começam com a resistência dos seus Estados-membros em aceitar uma compreensão mais amadurecida do que é soberania do espaço aéreo.

Soberania refere-se ao direito exclusivo das decisões e do controle político do Estado sobre o seu território e sobre o espaço aéreo acima dele. É considerado um ato de soberania a propriedade deste espaço aéreo e as decisões relacionadas com a maneira que os serviços de navegação aérea nele são providos. Porém, o Gerenciamento do Tráfego Aéreo (ATM), hoje em dia, é extenso o suficiente para atravessar fronteiras nacionais, mas a obsessão dos países por uma noção de soberania própria, e quase imutável, torna-se uma barreira para o aprimoramento e para a eficácia deste gerenciamento.

A iniciativa européia em não fragmentar o espaço aéreo para melhorar a performance do ATM, via criação de Blocos Funcionais de Cruzamento de Fronteiras nos céus europeus, tem caminhado progressiva, mas lentamente, por culpa das políticas de soberania. Nos Estados Unidos, o ATO (Air Traffic Organization) da FAA – Federal Aviation Administration – continua sem uma fonte independente de receita, e os fundos para a implantação de novas tecnologias no Sistema de Controle do Espaço Aéreo parecem que não serão obtidos com facilidade devido ao sentimento do Congresso Nacional americano de que é dele a soberania para gerenciar os serviços de navegação aérea. A tragédia das torres do WTC, em 11 de setembro de 2001, ainda tem muita influência neste tipo de resistência.

A visão da CANSO – Civil Aviation Navigation Services Organization – a respeito de um Sistema de Aviação integrado, equilibrado e interoperativo é de que este é muito dependente de uma compreensão amadurecida do conceito de soberania adotado por cada Estado. Bem atender a demanda do usuário, com um Serviço de Navegação ininterrupto e sustentado por um ambiente operacional amistoso e harmônico, pede liberdade. E este entendimento não requer qualquer tipo de apêndice à Convenção de Chicago, segundo Alexander ter Kuile, Secretario Geral da CANSO.

Dentro da ICAO há consenso de que o ATM precisa ser organizado funcionalmente. Igual força consensual também tem a idéia de que o espaço aéreo global requer uma organização sustentada além dos limites das fronteiras nacionais, consubstanciada e delineada nas exigências operacionais e na natureza da estrutura do tráfego em rota de cada país.

Autonomia para os Air Navigation Services Providers (ANSP) – Provedores de Serviços de Navegação Aérea –, e sua separação da função de supervisores da regulação do setor, também é bem definido no material-guia da ICAO. É evidente que uma maior autonomia operacional e financeira para a ANSP deve ser encorajada, sob uma abordagem de negócio, a fim de se conquistar uma melhora na qualidade dos serviços. Posterior a isto, será necessária a criação de um guia de cobrança pelos serviços prestados, permitindo aos provedores de serviço de navegação aérea a recomposição dos seus custos.

Na verdade, o ATM deve ser liberado para organizar e operar de maneira tal que permita o seu aperfeiçoamento, num ambiente mais harmonioso, seguro, eficiente e com um custo-benefício mais apropriado. A indústria da aviação, que vem sendo um dos sustentáculos do processo de globalização, deve considerar, com seriedade, a sua própria globalização através da ampliação consensuada das fronteiras do Air Traffic Management.

Dentro desta filosofia, torna-se evidente a necessidade de revisão dos conceitos de governança internacional da Aviação Civil. É tempo do sistema se liberar de antigos paradigmas, os quais têm embutidos noções e situações de relevância que serviram de base para a aviação do século passado, e que não servem mais para a atual. Há que se iniciar este processo pela adoção de um entendimento mais amadurecido do conceito de soberania dos Estados sobre os seus espaços aéreos, a fim de que a Gestão do Espaço Aéreo, no Sistema de Aviação Civil do novo século, possa estar totalmente alinhado com as realidades política, econômica e social do atual mundo globalizado.

Devemos estar atentos para um importante detalhe: nenhum sistema complexo, tal qual o da aviação, pode operar com harmonia, tendo de um lado idéias e conceitos supra-estatais modernos, e do outro lado uma prática operacional defasada por não acompanhar a modernidade que a globalização requer.

Os Estados-membros da ICAO e a indústria da aviação, em muitas questões, ainda estão se movimentando com “velocidades” díspares. Algo deve ser feito, com celeridade, para que os “ajustes de velocidade” sejam feitos com a precisão que os tempos atuais estão exigindo, e antes que a defasagem seja tão acentuada que torne o trabalho de ajuste mais difícil.

Baseado em artigo do ICAO Journal Vol. 63, No 1

Um comentário:

Anônimo disse...
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